ANPP ganha força em meio a posições não consolidadas e retroatividade em disputa

Publicado no ConJur

A discussão sobre a retroatividade da lei que criou o acordo de não persecução penal ganhou recentemente uma nova e importante frente, inaugurada pela 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal: é possível aplicar a regra até mesmo nos casos já transitados em julgado, desde que o pacote “anticrime” (Lei 13.964/2019) tenha entrado em vigor enquanto a ação penal ainda estava em curso.

A posição é a mais benéfica ao réu admitida até agora pelo Judiciário brasileiro. Nas cortes superiores e no próprio Ministério Público, há uma flagrante falta de uniformização que acaba por espraiar seus efeitos por toda a cadeia do sistema criminal brasileiro. Nem isso, no entanto, tem desestimulado ou coibido a busca pela solução de Justiça negociada.

A alteração promovida pelo pacote anticrime inseriu no Código de Processo Penal o artigo28-A para prever a possibilidade do acordo em situações específicas. A doutrina citada em votos e acórdãos aponta que a norma tem conteúdo processual-penal ou híbrido. Assim, ela pode ser abarcada pela previsão da Constituição Federal de que a lei penal pode retroagir para beneficiar o réu.

Falta definir até que ponto retroagir. A resposta definitiva virá do Plenário do Supremo Tribunal Federal, no HC 185.913, que começou a ser julgado em 2020, mas foi retirado do Plenário virtual por pedido de destaque. Relator, o ministro Gilmar Mendes defendeu a retroação até o trânsito em julgado das ações penais anteriores ao pacote anticrime. Essa é a posição defendida pela 2ª Turma do STF.

A 1ª Turma do Supremo e as duas turmas criminais do Superior Tribunal de Justiça defendem que a retroação seja possível enquanto o caso estiver na fase pré-processual — ou seja, até o recebimento da denúncia. A posição foi reafirmada pela 5ª Turma do STJ em julgamento recente no REsp 2.004.069, já levando em conta essa dispersão jurisprudencial.

Responsável por uniformizar a interpretação da lei federal — e, portanto, do pacote “anticrime” —, o STJ tem ajudado a delinear o uso do ANPP. A corte definiu que o MP não pode eleger a confissão imediata e prematura do réu em sede policial ainda na fase de inquérito como requisito obrigatório para o acordo.

Também fixou que essa confissão extrajudicial feita por interessados em firmar ANPP não pode ser usada para embasar a condenação de outros acusados em ação penal. E que, no caso de recusa do acordo, o Judiciário não deve decidir se deve haver remessa do caso ao órgão superior do parquet, pois sua atuação se resume à analise do requisitos objetivos de cabimento do ANPP.

A competência para execução do ANPP é do juízo que o homologou. Caso o apenado resida em outra comarca, o juiz competente poderá transferir ao juízo daquele local apenas os atos processuais e de fiscalização.

Recentemente, a 5ª Turma do STJ firmou precedente importante ao entender que é possível análise do ANPP no caso em que o réu passa a preencher os requisitos legais após o julgamento da apelação. E em outro caso, o ministro Rogerio Schietti decidiu que um ANPP não deve se manter válido quando é cabível a aplicação do princípio da insignificância. O MP de São Paulo recorreu e o caso será julgado pela 6ª Turma.

Edward Rocha de Carvalho, do escritório Miranda Coutinho, Carvalho e Advogados, também vê o uso do ANPP como muito proveitoso. “Melhorou muito para os casos de menor gravidade. É bom para desafogar a Justiça e resolver a questão. São vários casos resolvidos na origem”, relata.

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